quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Para PT, Dilma é a mudança que o país deseja

Estava crivada de ironias a festa em que o PT comemorou seus 34 anos e relançou Dilma Rousseff ao Planalto, na noite desta segunda-feira (10). A presidente chamou seus rivais de “caras de pau”. E Rui Falcão, o comandante do PT federal, tachou Aécio Neves de “neopassadista” e a dupla Eduardo Campos-Marina Silva de “novovelhistas”. Falcão soou implacável: “Parecem farinha do mesmo saco.”
Quando ele declarou isso, decerto quis dizer que o afastamento de Eduardo Campos, um aliado de dez anos, e de Marina Silva, petista por três décadas, permitirá ao PT melhorar a qualidade do seu pirão. No saco do partido não haverá mais espaço para farinha de má reputação. Nada de Sarney, Renan, Collor, Maluf, Kassab… O PT voltará a ser aquela farinha pura que a todos impressionava.
A militância aplaudiu. Ela precisa acreditar na tese da purificação, porque, se o companheiro Falcão quis dizer que os aliados que ficaram são melhores do que os dois desertores, a única conclusão possível é que ele: a) não entende de farinha; b) é a primeira vítima de um surto nacional da doença da vaca louca; ou c) é um cínico.
Como nenhum militante petista que fazer mau juízo do seu presidente, ficou entendido que ele admitiu que o PT misturou-se, sim, à farinha errada. Mas vai mudar de saco. O PT seria apenas um partido realista lidando com uma farinha notoriamente intoxicada, adotando seus meios para fins nobres. Mas acabou. Por favor, gente: de agora em diante, seletividade. Vejam lá em que saco vocês vão se meter!
Falcão acha que a oposição e a mídia golpista não tomam jeito. “Nossos oponentes desencadearam contra nosso governo e o PT uma campanha sórdida, amparada por uma certa mídia ligada estreitamente aos partidos de oposição. É uma campanha voltada para semear a incerteza, o pessimismo e até o medo entre o povo. Promovem verdadeiras ações de terrorismo psicológico, um enorme tsunami de boatos, esperando, assim, nos bater nas urnas.”
Dilma concorda: “Antes mesmo de olhar e avaliar a grande obra que nós realizamos, eles têm a cara de pau de dizer que o ciclo do PT acabou, que o nosso modelo se esgotou, que nós demos o que tínhamos de dar.” O que aborrece a presidente é que “os pessimistas aproveitam alguns desequilíbrios típicos de uma conjuntura internacional muito difícil para dizer que o fim do mundo chegou.” Ela levanta a voz: “Chegou, sim. Mas chegou pra eles! E isso faz muito tempo.”
O que tranquiliza Falcão é a sabedoria do brasileiro. “Como de outras vezes, o eleitorado não vai se confundir nem se deixar iludir.” Até porque os atores estão bem distribuídos no palco. “De um lado temos o PT, o governo e uma presidenta que segue sempre em frente. Do outro lado, temos dois grupos, que, de tanto se enrolar em suas mesmices, parecem ser o que realmente são: partes do mesmo corpo, um corpo cujos pés não obedecem a cabeça, que os faz caminhar de forma errática, perdidos em labirintos por eles mesmos criados.”
O tucanato “neopassadista” já é manjado. Quanto ao bloco “novovelhista” de Campos e Marina, “é politicamente obtuso”. Os dois talvez já fossem obtusos antes, mas obtusos do lado certo. Marina exercitou sua obtusidade como ministra do Meio Ambiente de Lula. E Campos teve a obtusidade dele financiada com os bilhões em verbas federais que Lula repassou para o governo de Pernambuco.
Como viraram obtusos do contra, Falcão agora só consegue enxergar as rugas:  “Os novos velhos ou falsos novos pensam que com os discursos fáceis serão capazes de mudar o Brasil e de fascinar os brasileiros. Da boca deles, quando ouvimos que o novo é o novo, é o novo, é o novo… apenas ouvimos a mais patética, dramática e caquética cena da velha política.”
O mandachuva do petismo acha que a dupla de ex-aliados carnavalizou-se: “O que chamam de novo é cobrir de paetês, agora que o Carnaval está chegando, velhas oligarquias e falsas alegorias. O algo novo é ser um herdeiro [de Miguel Arraes] que não ampliou a herança? O algo novo é ser caudatário e se dizer nascente?”
Falcão lançou na atmosfera um lote de interrogações: “Companheiros e companheiras, pergunto a vocês todos, pergunto ao Brasil, e espero pacientemente a resposta: o que de verdadeiramente original, de novo eles fizeram durante décadas em seus Estados? O algo novo por acaso é o nepotismo? O algo novo é, por exemplo, passar a chamar de loteamento de cargos a experiência democrática do governo de coalisão, que eles mesmos praticaram e praticam com afinco e desenvoltura, e eu diria até quase com despudor?”
Como ninguém quer abusar da paciência de Falcão, é melhor responder. O ápice do nepotismo de Campos foi a campanha que ele empreendeu para fazer da mãe, Ana Arraes, ministra do TCU. Graças à ajuda de Lula, teve sucesso. Nas Minas Gerais de Aécio e no Pernambuco de Campos, o rateio de cargos envolveu as mesmas legendas que, em Brasília, receberam de Lula e Dilma, com total despudor, pedaços do Estado. No seu Acre, Marina sempre foi uma festejada aliada dos sucessivos governos dos irmãos petistas Jorge e Tião Viana.
A alturas tantas, o presidente do PT tropeçou numa poça de realidade: “Sabemos que a população quer mudança. As jornadas de junho de 2013 mostraram isso.” Mas a cavidade lhe parece rasa. Tão rasa que uma formiga a atravessaria com água pelas canelas: “O povo quer mudanças com Dilma, pois não se deixa seduzir por aqueles que falam em mudar, mas nada acrescentam de verdadeiramente novo ou criativo.”
Dilma também se deparou com a poça em seu discurso: “…Queremos enfrentar e transformar a qualidade, que é baixa, de todos os serviços públicos”. Como melhor exemplo da transformação ela cita o Mais Médicos. O programa “sofreu e ainda sofre o descrédito e a resistência organizada por alguns segmentos que nós conhecemos. Mas, em compensação, já se consagrou junto a grandes camadas da população.”
Munida de autocritérios, Dilma faz o melhor governo que Dilma já viu. Os adversários dizem que “esse governo poderia ter feito mais. Eu digo, com realismo e humildade, que o programa realizado por um governo sério, que quer o bem do povo, em qualquer época e em qualquer circunstâncias, é só um começo. Um governo sério sempre deixa claro que é preciso fazer mais. Nos governos sérios como os nossos, cada conquista assegurada, cada olbra realizada… sempre é só um começo.”
Nesse começo que já dura 11 anos, Dilma dispensa os pitacos da oposição. Ela é autosuficiente. “Ninguém cobra mais de mim do que eu mesma. Ninguém questiona mais o meu governo do que eu própria. A verdade é que nós demonstramos que não nos conformamos. Não somos conformistas, não paramos, nós sempre seguimos em frente. Possuo energia e disposiçao redobrada para fazer mais.”
Isso é que é governo eficiente! Ele mesmo erra, ele mesmo admite que a sociedade exige mudanças, ele mesmo se dispõe a corrigir. Como não faz sentido estipular prazos para a felicidade, ao eleitor só resta reeleger Dilma. O Éden dispensa a campanha. Mas se quiserem manter, por mera formalidade, o calendário eleitoral, convém prestar atenção ao aviso do companheiro Falcão:
“Que ninguém se engane. Fica aqui o nosso alerta: o PT não nasceu para apanhar calado. Não vamos levar recado pra casa nem virar saco de pancadas de uma legião de derrotados. Sim, parece que bater no PT virou mania e obsessão em certos setores frustrados da sociedade. Mas não basta o coro histérico de determinada imprensa ou a obsessão neurótica e injusta de certos setores empresariais. Somos obrigados agora a assistir a um abusurdo: membros da mais alta Corte do país, que prejulgam insultando, suspeitam caluniando…”
A plateia de militantes interrompeu Falcão para gritar os nomes dos companheiros “condenados injustamente” no mensalão. José Dirceu, João Paulo Cunha, José Genoino e Delúbio Soares foram saudados como “guerreiros do povo brasileiro”. Foi a reunião de uma irmandade. Todos iguais. Uns a cara esculpida e escarrada dos outros. Farinha de outro saco.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O bem de família Brasileira